Boas notícias

 

Acordo todos os dias da semana as seis e ligo a TV no Jornal do SBT. Só más notícias.Já levanto da cama me lembrando que o mundo é um lugar traiçoeiro e perigoso.Mudo para o DFTV e a mensagem que recebo é que Brasília é um lugar violento e corrupto.Isso sem falar das tomadas ao vivo do helicóptero do Jornal da Record mostrando que vou encarar um engarrafamento quilométrico para qualquer direção que eu vá neste dia.Definitivamente,não é uma boa maneira de acordar.

Talvez por isso prefira a Rede Brasil.Eles sempre mostram alguma coisa boa em meio ao caos. Tem sempre uma reportagem sobre alguma pesquisa promissora feita pela Embrapa, ou algum tratamento na área de saúde que já está disponível pelo SUS. Mas até eles não estão contando muita coisa boa ultimamente.Acho que não andam procurando direito. A vida está explodindo em cores, a primavera finalmente mostrou as caras no Planalto Central e tudo reluz em tons de verde, rosa, ouro e prata.

Lembra-me uma crônica de Ruben Braga que falava sobre os milagres que acontecem todos os dias sem que ninguém perceba.As grandes bênçãos serão sempre em número muito maior que as tragédias, mas como são na maior parte das vezes sutis, não percebemos, não somos envolvidos por elas e nem agradecidos.

Ontem saí de casa e tentei percebê-las. E sabe de uma coisa? O velho Braga estava certo! As boas notícias estavam lá, mas só pude percebê-las nos instantes em que pude silenciar a mente do caos.

Ontem vi um belo senhor deixar seu filho na escola e dar-lhe um beijo no alto da cabeça e dizer um eu te amo, apenas com o olhar.

Vi uma linda mulher que o Globo Repórter com certeza chamaria de “obesa”,absolutamente deslumbrante, valorizando suas formas voluptuosas em uma frente única laranja e uma saia rosa,longa e rodada e esta mulher seguia para o ponto de ônibus com um ar feliz,completamente alheia ao que quer que fossem pensar dela.

Dois passarinhos vejam, não foi apenas um, foram dois,pousaram no retrovisor de um Polo cinza estacionado embaixo de uma mangueira.E sua proprietária que por acaso sou eu, adiou sua saída para não incomodar os dois.Ficou parada no sol, se recusando a aproximar da mangueira ou desligar o alarme do carro e perturbar o carinho do casal.

Fui trabalhar mais leve e me permiti imaginar o Willian Bonner e a Fátima Bernardes iniciando o Jornal Nacional a noite com a seguinte manchete:

“Hoje, por volta das 18 horas, Micaelly Rillary da Silva, moradora da Comunidade Fazendinha, chegou em casa cansada, com dor de cabeça e muito calor e encontrou Robilson,seu companheiro, saindo de  um banho frio, cheirando a sabonete Lux Luxo”.

Willian Bonner prosseguiria:

“Robilson abraçou Micaelly, dando-lhe um beijo no pescoço e o frescor de seu corpo aliviou o mal estar dela que foi guiada por ele ao chuveiro onde permaneceram juntos brincando sob a água.Vizinhos afirmaram que o casal permaneceu em casa durante a noite faltando a costumeira roda de samba no bar do Mané, só sendo vistos pela manhã lavando e estendendo roupas no varal. Dona Jacira,moradora da casa ao lado afirmou que ambos sorriam muito,como se compartilhassem um bom segredo!

Dona Jacira também relatou aos repórteres ter melhorado muito das dores nas costas graças as massagens feitas por sua neta com o doutorzinho comprado na loja do 1,99“.

Com certeza muitos dirão que sou alienada. Não ligo.Então ser alienada é querer ver algum lirismo no dia a dia de uma pessoa comum? Pois eu retruco: alienada é se recusar a ver a beleza  e optar só por preocupações. Alienada é passar o dia franzindo a testa e falando de coisas ruins para passar a falsa imagem de pessoa séria. Espero nunca ficar assim!